segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Primórdios da Nova Maldição

 “O tempo estava cinza, e quando mais adentrava seus delírios, mais escuro parecia ficar.  Há quanto tempo não via o sol? Os cabelos, de enrolados que eram, agora escondiam folhas e poeira pelos nós mal penteados. E como o vestido estava sujo... Mas não se importava. Não naquele momento. O tempo parecia sufocar-lhe, a respiração parecia cessar a cada passo dado. As pernas bambeavam por vezes, resultado da fome excessiva. A pele parecia mais pálida do que o normal, podia ver as veias pulsarem fracas. O coaxar dos sapos misturava-se com o som das folhas que rolavam no chão junto a força do vento. Não enxergava nenhum deles, os animais pareciam embrenhados no mato. Via apenas um. Era o maior que já vira, tinha uma mancha no meio dos olhos, que a fitavam, a chamavam para mais perto. E sem controle sobre as pernas, seguia até ele. Quando de frente com o bicho – que era da altura de seus joelhos – percebera que uma linha grossa estava costurada em sua boca.
Em seu inconsciente, sabia do que as lendas rezavam quanto a sapos com a boca costurada. Mas não sabia a quem o bicho estava fazendo mal. No tempo que ficara olhando para ele, ele fora murchando, como se antes estivesse cheio de ar e uma agulha o tivesse furado. Fora esvaziando, sua gosma espalhando-se ao redor. Os olhos permaneciam vidrados nela.
E aos poucos, foi abrindo a boca. Suzana sentiu-se agoniada. A pele esverdeada ia rasgando aos poucos, deixando a linha preta mais visível. A abertura escura logo fora coberta por sangue, a pasta vermelha escorrendo e manchando o chão. Teve de prender a respiração pelo cheiro forte que o liquido exalava, como carniça. Mas não desprendera os olhos do animal, que igualmente continuava a fitá-la. Até esvaziar completamente.
Teve de dar um passo a mais para frente, assim saberia o necessário. Como era de se esperar, havia um papel amassado em meio à crosta de sangue, a qual a terra comia. Abaixou-se, pegando-o assim e abrindo-o “.

Quando um nome era rabiscado num papel qualquer e costurado dentro do estomago de um sapo, o animal aos poucos definhava com a fome e sede. Os mais velhos diziam que o mesmo aconteceria ao enfeitiçado. Quando Suzana acordara, não fora difícil associar o sonho ao nome da pessoa que encontrara. Isabel parecia dormir, mas o cheiro de morte era semelhante em sua pele, por mais que soubesse que ele não existia realmente. (...)”

Por A. Sade
Baseado na Obra A Maldição do Sangue.

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