sábado, 30 de julho de 2011

A Forca dos Anjos ( . . . )

    Estavam parados. Os dois. Os olhos por vezes desviavam para as paredes encardidas, mal iluminadas pela luz do sol. Mas acabavam por fixar os olhos nos corpos novamente. Ela, a pele branca manchada de discretas sardas, que percorriam o pescoço, descendo pelos ombros e braços, espalhando-se pela barriga. Os cabelos vermelhos estavam jogados sobre os seios, compridos, lisos, destacava-se na pele branca visivelmente trêmula. Ele observava, disfarçava, mas observava cada curva bem feita de seu corpo. Voltava a seu rosto, os olhos ardendo em chamas. Mexia os dedos dos pés descalços no chão de terra, sentia o corpo todo reagir aos toques que ainda não tinha sentido, o órgão enrijecer, os músculos tremerem. Não tinha idéia de como dar o próximo passo, por mais fácil que teoricamente pudesse parecer. E um tempo mais a olhando, chegou a conclusão de que poderiam ficar ali para sempre, enquanto o sempre durasse. O tempo que precisassem. Ela não estava segura. Sentia-se pura uma primeira vez na frente dele e não achava justo. Não era justo ser a Virgem Maria quando um coral de vozes chamavam-na de Maria Madalena. Como se os primeiros olhos a contemplar seu corpo nu fossem os dele, mas como santa prostituta, sabia ela que não era bem a verdade. Ele entenderia se ela o explicasse que não fora por querer, que num colégio dirigido por cardeais católicos, os pecados tinham de ser pagos de outra maneira, se lhe contasse quantas lágrimas haviam manchado seu rosto quando o liquido sagrado era derramado em sua boca. Mas o menino não pensava, não sabia, não imaginava. E pela primeira vez em sua vida, sentiu o coração bater mais forte, tão forte que lhe faltava. No alto da capela sem habitação, o sino tocava dando início a mais uma missa na capela central. Os companheiros de dormitórios não sentiriam a falta deles... E se sentissem... Bem, do que importava? Estavam parados. Os dois. E ali poderiam ficar, nus, em meio a baldes de gelo no estômago e sensações inevitáveis para ambas as partes, apenas se olhando. Eram jovens. Tinham todo o tempo do mundo.


Por A. Sade

terça-feira, 26 de julho de 2011



       caminhava por entre o castelo de cartas de baralho, a torre erguia-se simples num Ás de copas. Nos pés, as meias coloridas vinham-lhe até os joelhos, era apenas com que estava vestida. Na estrada de terra azul, encontrara amigos com os rostos cobertos, mas as máscaras eram as menores do mundo, resumiam-se em narizes vermelhos. Encontrara amigos transparentes, mas suas cores eram tão fortes que não podia afastar-se. Amigos feitos de letras. E quando em cima do picadeiro, os trotes à cavalo traziam em cima de seu dorso um homem menino, os cabelos de anjo, um sorriso que lhe tomou. As estrelas aplaudiram, deixando o brilho recair-se sobre ela... e o céu oferecera-lhe o arco-íris. E todo o sangue que manchava sua face, caindo de seus olhos, não lhe traziam mais dor. A gigante, maior do que todas as criaturas da terra, maior do que todos os seres do céu, aproximara-se então e assim tomou o sangue para si, assim como tomaria as cores que lhe foram dadas. E borrando uma folha velha de caderno,escreveria sua história.

Por A. Costa